REFORMA TRIBUTÁRIA: O QUE MUDA PARA AS AGÊNCIAS DE VIAGENS — RISCOS, VANTAGENS E COMO SE BENEFICIAR
- Alex de Araújo Vieira

- 5 de ago.
- 38 min de leitura

A Reforma Tributária, instituída pela Emenda Constitucional nº 132/2023 e regulamentada pela Lei Complementar nº 214/2025, representa a mais ampla transformação do sistema de tributos sobre o consumo no Brasil desde a Constituição de 1988.
Com a substituição do PIS, COFINS, ISS e ICMS por dois tributos modernos — a CBS (Contribuição sobre Bens e Serviços) e o IBS (Imposto sobre Bens e Serviços) —, as empresas precisarão adaptar seus processos, sistemas e contratos. Mas, para as agências de viagens, essa transição também abre oportunidades reais de ganho competitivo, simplificação e racionalização tributária.
A implementação será gradual. Em 2026, inicia-se a chamada fase de testes, com cobrança simbólica de CBS (0,9%) e IBS (0,1%), valores que poderão ser compensados com tributos federais, ou dispensados integralmente caso as obrigações acessórias sejam cumpridas corretamente. Importante: contribuintes que cumprirem integralmente as obrigações acessórias do novo sistema estarão dispensados do recolhimento desses tributos nesse primeiro ano.
A partir de 2027, com a extinção do PIS e da COFINS, inicia-se a cobrança efetiva da CBS, e o novo Imposto Seletivo entra em vigor. Já entre 2029 e 2032, ICMS e ISS serão gradualmente reduzidos, enquanto o IBS ganha escala. O sistema se completa em 2033, com a extinção total do modelo anterior.
Embora o cenário envolva desafios, o novo regime confere tratamento tributário específico e vantajoso às agências de turismo, com base de cálculo limitada à comissão, alíquota reduzida de 15,90% e possibilidade de gerar crédito integral ao cliente — desde que haja segregação adequada dos valores repassados a terceiros e correta estruturação contratual e fiscal. Isso significa tributar apenas a receita própria da agência, evitando autuações e perdas operacionais decorrentes do sistema de split payment.
Além disso, no regime normal de apuração (Lucro Presumido ou Lucro Real), os valores de CBS e IBS são destacados na nota fiscal e geram créditos integrais para o tomador do serviço, o que representa uma importante vantagem competitiva em operações business to business (B2B), nas quais o custo tributário pode ser compensado ao longo da cadeia.
Já no Simples Nacional, a carga tributária é unificada no Documento de Arrecadação do Simples (DAS), sem o destaque individualizado de IBS e CBS, o que impede o aproveitamento de créditos pelo cliente adquirente. Como consequência, empresas optantes pelo Simples podem se tornar menos atrativas comercialmente nesse tipo de relação, sendo pressionadas a conceder descontos ou a migrar para um regime híbrido — no qual permanecem no Simples apenas para os tributos sobre a renda, mas passam a apurar IBS e CBS no regime regular —, a fim de preservar sua competitividade no mercado.
O quadro a seguir compara os três regimes sob os aspectos mais relevantes da nova sistemática:
Regime Tributário | Alíquota IBS/CBS (após redução de 40%) | Possibilidade de crédito para o cliente | Segregação de valores de terceiros | Vantagem competitiva no mercado B2B | Exigência operacional e documental |
Simples Nacional | Inclusa no DAS (sem destaque separado até 2027) | Não gera crédito até 2027; a partir daí, crédito parcial se destacado | Obrigatória para evitar autuação e bitributação | Baixa até 2027; pode melhorar com regime híbrido | Moderada; aumenta em caso de regime híbrido (apuração separada) |
Lucro Presumido | 15,90% sobre a receita | Gera crédito integral sobre IBS/CBS destacados | Obrigatória para limitar a base tributável | Alta: permite repasse do crédito ao cliente | Alta (exige controle e documentação fiscal rigorosa) |
Lucro Real | 15,90% sobre a receita | Gera crédito integral sobre IBS/CBS destacados | Obrigatória para limitar a base tributável | Alta: permite repasse do crédito ao cliente | Muito alta (controle detalhado de custos e créditos) |
Agências que não se adaptarem de forma estratégica às novas regras — seja por falha na segregação fiscal, omissão no destaque da remuneração ou desorganização documental — poderão enfrentar riscos fiscais, retenções indevidas de tributos pelo split payment e perda de competitividade, especialmente diante de concorrentes que permitirem o aproveitamento de créditos por seus clientes corporativos.
A correta interpretação da legislação, aliada à emissão fiscal precisa e à reestruturação contratual, será determinante para manter margens saudáveis e garantir posição sólida no mercado B2B. O que está em jogo não é apenas conformidade, mas vantagem competitiva em um setor cada vez mais pressionado por custos e exigência técnica.
Este material foi desenvolvido pela equipe do VDR | Vieira & Di Ribeiro Advogados, escritório formado por advogados que há duas décadas prestam assessoria jurídica especializada ao setor de turismo. Ele responde, de forma clara e fundamentada, dúvidas centrais sobre os impactos da reforma tributária nas operações das agências de viagens, abordando aspectos fiscais, jurídicos, operacionais e contratuais.
Para facilitar a compreensão e permitir uma aplicação prática e imediata das novas regras, este material foi estruturado em seis blocos temáticos, que seguem a seguinte ordem lógica:
I. Fundamentos e oportunidade para as agências
1. Como a nova legislação trata a intermediação de serviços de terceiros?
2. A agência será tributada sobre o valor total da nota fiscal (inclusive valores de terceiros) ou apenas sobre sua remuneração (comissão ou fee)?
3. Haverá tratamento específico para operações de intermediação com destaque de valores de terceiros?
4. A legislação define regras para identificação clara do comitente e do prestador real na nota fiscal?
5. Se a agência atua por comissão (fee declarado), a base de cálculo será somente a comissão?
6. Se a agência pratica markup embutido, o IBS/CBS incidirá sobre o total ou só sobre a diferença?
II. Split payment e riscos operacionais
7. Como funcionará o split payment e como será o tratamento quando o valor total recebido pela agência incluir verbas destinadas a repasse a terceiros?
8. Como o novo regime afeta o caixa, o capital de giro e o recebimento da comissão?
9. O modelo de negócio pode levar o fisco a entender que a agência é a prestadora do serviço principal?
10. A agência pode ser considerada fornecedora do serviço total, portanto, responsável tributária por toda a operação?
III. Bitributação e segregação fiscal
11. Há risco de bitributação entre a agência e o fornecedor (ex: hotel, companhia aérea)?
12. É possível destacar os valores de terceiros na nota fiscal? Isso afeta a tributação?
13. A legislação e os leiautes da Nota Fiscal Nacional (NFS-e) permitem segregar claramente o valor do serviço do fornecedor? Esse destaque exclui tais valores da base do IBS/CBS?
IV. Crédito para clientes e impacto competitivo
14. Os clientes da agência terão direito ao crédito integral dos tributos destacados?
15. Qual é o impacto da Reforma Tributária no modelo de faturamento?
16. Qual o melhor regime tributário para a agência diante da reforma? Se a agência estiver no Simples, vale a pena migrar para o regime normal para possibilitar créditos ao cliente?
V. Regimes específicos, aproveitamento dos créditos e planejamento
17. A agência de viagens poderá ser beneficiada por regimes diferenciados de tributação?
18. O regime de Margem de Valor Agregado (MVA) se aplica às agências de viagens?
19. O que a agência pode fazer com os créditos de IBS e CBS nas compras de serviços turísticos?
VI. Contratos e ajustes operacionais para garantir os benefícios fiscais
20. Como a reforma afeta contratos em andamento e operações futuras?
21. Como os contratos em vigor devem ser ajustados para garantir a correta segregação de valores, o destaque da comissão na nota fiscal e a aplicação automática do regime específico previsto na LC nº 214/2025?
22. Como a agência deve formalizar sua relação com fornecedores para reforçar o enquadramento como intermediária e garantir os benefícios do novo regime?
23. Quais cuidados devem ser adotados pelas agências que contratam diretamente fornecedores em nome próprio, fora do modelo de intermediação?
24. Quais são os pontos centrais de um checklist para adequação à Reforma Tributária?
25. Glossário essencial da Reforma Tributária para Agências de Viagens.
Use este material como ponto de partida para estruturar sua adequação à reforma, orientar sua equipe, revisar seus contratos e atualizar seus sistemas de gestão fiscal. Cada tópico foi cuidadosamente selecionado para refletir os principais pontos de atenção identificados nas consultorias prestadas pelo escritório.
Boa leitura!
Alex de Araújo Vieira - VDR | Vieira & Di Ribeiro Advogados, OAB/SP 13.661
www.vieiradiribeiro.com.br | contato@vieiradiribeiro.com.br | Tel/Whatsapp: 11-5026-2012
Fundamentos e oportunidade para as agências
1. Como a nova legislação trata a intermediação de serviços de terceiros?
A nova legislação, especialmente a Lei Complementar nº 214/2025, trata com atenção a intermediação de serviços de terceiros, buscando assegurar que a base de cálculo do IBS e da CBS reflita apenas a receita própria do intermediador — ou seja, a comissão ou remuneração pelo serviço de intermediação, e não o valor total da operação realizada entre terceiros.
Na LC 214/2025 a intermediação de serviços de terceiros, tal qual a realizada por agências de viagens, está regulamentada com base nos seguintes pontos centrais:
a) Base de cálculo restrita à receita própria: A intermediação, quando claramente identificada, deve ser tributada apenas sobre a remuneração da agência, como comissão, fee ou taxa de serviço.
b) Necessidade de destaque claro na nota fiscal: A segregação entre valores de terceiros (ex: passagens aéreas, hotelaria) e a remuneração da agência deve estar expressa na nota fiscal.
c) A nota fiscal deve especificar a condição de intermediador, conforme previsto nos artigos da LC 214 e nos novos leiautes de nota fiscal (NF-e/NFS-e).
d) Tratamento específico para faturamento por conta e ordem: Caso a agência fature em nome próprio o valor do serviço prestado por terceiro sem identificação clara, pode haver interpretação de que a agência está prestando o serviço principal, com tributação sobre o valor total.
e) Risco de bitributação ou conflito de competência: Em operações mal estruturadas, pode haver tributação simultânea sobre a operação pelo fornecedor (ex: companhia aérea) e pela agência (sobre o total da fatura), principalmente se o modelo não for corretamente formalizado.
2. A agência será tributada sobre o valor total da nota fiscal (inclusive valores de terceiros) ou apenas sobre sua remuneração (comissão ou fee)?
Depende da forma como a operação for estruturada e documentada, segundo a Lei Complementar nº 214/2025 e os princípios da não cumulatividade e da neutralidade que regem o IBS e a CBS.
Se a agência de viagens atua como intermediária e isso está devidamente formalizado, a tributação do IBS e da CBS ocorrerá apenas sobre a remuneração auferida pela intermediação, como:
· Comissão fixa ou percentual;
· Taxa de serviço (service fee);
· Remuneração declarada por meio de nota fiscal com valores de terceiros destacados.
Isso está de acordo com o art. 12, §2º da LC 214/2025, que define que a base de cálculo deve refletir o valor efetivamente auferido a título de receita pela prestação do serviço, bem como com o §1º do art. 289 que dispõe: “§ 1º O valor da operação de que trata o inciso I do caput deste artigo compreende o valor total cobrado do usuário do serviço da agência, nele incluídos todos os bens e serviços prestados e usufruídos com a intermediação da agência, somados a sua margem de agregação e outros acréscimos cobrados do usuário.”
Por outro lado, se a agência emite nota com valor total (com serviços de terceiros embutidos) e não há destaque da comissão, o fisco pode considerar que:
· A prestação do serviço está sendo feita pela própria agência, e
· O valor total é a base de cálculo do IBS/CBS.
Tal situação se aproxima da figura do “modelo de precificação por valor global com margem embutida”, que exige cuidado, pois a agência pode acabar tributada sobre o valor de passagens, hotéis, etc., mesmo não sendo a prestadora desses serviços.
Nestes casos, o §2º do art. 12 da LC 214/25 determina que não integram a base de cálculo do IBS e da CBS “os reembolsos ou ressarcimentos recebidos por valores pagos relativos a operações por conta e ordem ou em nome de terceiros, desde que a documentação fiscal relativa a essas operações seja emitida em nome do terceiro;”
Portanto, como conclusão, a tributação somente sobre a comissão/fee é possível e recomendável, desde que a agência:
· Formalize claramente o papel de intermediadora;
· Emita nota fiscal destacando os valores repassados a terceiros;
· Evite ocultar ou embutir remuneração na fatura total;
· Adote contratos e documentos fiscais coerentes com o modelo de intermediação.
Se a opção da agência for a de continuar executando o pagamento aos fornecedores por conta e ordem do cliente, as notas fiscais dos fornecedores deverão ser emitidas em nome do cliente e a documentação que confere à agência a capacidade de pagar em nome dele ao fornecedor deverá ser muito bem estruturada.
3. Haverá tratamento específico para operações de intermediação com destaque de valores de terceiros?
A LC 214/2025 permite que, nas operações de intermediação, os valores de terceiros sejam destacados na nota fiscal e não integrem a base de cálculo do IBS e da CBS, desde que a agência atue como mera intermediadora e isso esteja claramente evidenciado na documentação fiscal.
Art. 12 – Base de Cálculo do IBS e da CBS: § 2º A base de cálculo do IBS e da CBS será o valor da operação, deduzidos os valores recebidos por conta de terceiros, desde que o sujeito passivo esteja atuando como mero intermediador, sem assumir responsabilidade pela prestação do serviço ou entrega do bem.
Art. 60 – Documento Fiscal Eletrônico: § 1º As informações prestadas pelo sujeito passivo nos termos deste artigo possuem caráter declaratório e constituem confissão do valor devido de IBS e de CBS consignados no documento fiscal. § 4º Os documentos fiscais eletrônicos deverão seguir padrões técnicos uniformes e conter informações segregadas, quando exigido, para apuração adequada dos tributos.
A NT 2025.002 e os novos leiautes (NF-e/NFS-e) introduzem o campo específico para a separação da receita própria (comissão) e a indicação de valores recebidos por conta e ordem de terceiros (ex: hotéis, companhias aéreas), de modo a garantir:
· Apuração correta da base tributável;
· Evitar a incidência sobre valores não pertencentes ao intermediador;
· Viabilizar o crédito apropriado pelo adquirente.
4. A legislação define regras para identificação clara do comitente e do prestador real na nota fiscal?
A LC 214/2025, combinada com a Nota Técnica 2025.002 e os novos leiautes da NF-e e NFS-e, estabelece regras que viabilizam a identificação do comitente e do prestador real nas operações intermediadas.
Fundamentos:
1. Art. 60 da LC 214/2025 – Documento Fiscal Eletrônico
O sujeito passivo deverá emitir documento fiscal eletrônico com informações declaratórias, que constituem confissão de dívida.
§ 3º O Comitê Gestor do IBS e as administrações tributárias definirão, em ato conjunto, a forma, o conteúdo e os prazos dos documentos fiscais eletrônicos, incluindo dados necessários à correta apuração dos tributos.
2. Nota Técnica 2025.002 (RTC) – Alterações no leiaute da NF-e
Criação de campos para:
Identificação do intermediador (agência);
Identificação do comitente (cliente final);
Identificação do prestador real do serviço (ex: hotel, companhia aérea);
Separação entre valor da comissão e valor repassado;
Código de Classificação Tributária – cClassTrib, para garantir a correta apuração.
Sim, a legislação define regras e instrumentos para que a nota fiscal reflita com clareza o papel da agência como intermediadora, informando:
· Quem é o cliente (comitente);
· Quem é o prestador real do serviço;
· Qual é a remuneração da agência.
Isso é essencial para garantir a tributação apenas sobre a comissão e evitar autuações por base de cálculo ampliada.
5. Se a agência atua por comissão (fee declarado), a base de cálculo será somente a comissão?
Sim. Quando a agência atua por comissão declarada ou taxa de serviço expressamente destacada, a base de cálculo do IBS e da CBS será apenas a comissão.
Fundamento:
Art. 12, §2º da LC 214/2025: permite excluir da base de cálculo os valores repassados a terceiros, desde que o sujeito passivo atue como mero intermediário e isso conste claramente no documento fiscal.
6. Se a agência pratica markup embutido (ex: preço bruto R$ 10.000 com custo de R$ 9.000), o IBS/CBS incidirá sobre os R$ 10 mil ou só sobre a diferença (R$ 1.000)?
Se a agência não destaca a comissão e emite a nota com o valor total (ex: R$ 10 mil), o fisco pode entender que a base de cálculo do IBS/CBS é o valor total, e não só os R$ 1 mil de remuneração.
O IBS e a CBS poderão incidir sobre os R$ 10.000, mesmo que R$ 9.000 sejam repassados ao fornecedor, aumentando a carga tributária efetiva da agência.
Ou seja, se não houver destaque da comissão, a agência será presumida como prestadora do serviço integral, o que torna obrigatória a tributação sobre o total.
Caso o markup seja mantido, recomenda-se segregar a comissão e declarar formalmente a intermediação no documento fiscal, para evitar que o valor total seja considerado base de cálculo.
Split payment e riscos operacionais
7. Como funcionará o split payment e como será o tratamento quando o valor total recebido pela agência incluir verbas destinadas a repasse a terceiros?
A LC 214/2025 prevê a criação de um sistema nacional de split payment, a ser disponibilizado e gerenciado pelo governo, por meio do Comitê Gestor do IBS e da CBS.
Split payment é o sistema de pagamento fracionado dos tributos, no qual o valor correspondente ao IBS e à CBS é automaticamente retido e recolhido aos cofres públicos no momento do pagamento da operação, sem transitar pelo caixa do prestador ou vendedor.
A implantação desse sistema será gradativa a partir de 2026 e a obrigatoriedade mais ampla se dará a partir de 2029, com a substituição plena do ICMS e do ISS. Ele será parte da infraestrutura oficial de arrecadação e apuração assistida dos novos tributos e funcionará com liquidação financeira vinculada.
Quando um pagamento for feito a um fornecedor, o sistema irá automaticamente:
· Identificar os tributos incidentes (IBS, CBS);
· Separar os valores dos tributos da quantia bruta;
· Recolher diretamente aos cofres públicos a parcela referente ao IBS e à CBS;
· Depositar apenas o valor líquido (sem o tributo) ao fornecedor.
Isso valerá para pagamentos por transferência bancária, cartão de crédito ou débito, PIX e outros meios regulados pelo Banco Central. Obs.: O sistema será integrado aos bancos, adquirentes e instituições de pagamento, conforme regulamentação futura.
Para agências que faturam valores de terceiros com comissão embutida, o split payment pode provocar recolhimento indevido de tributo se:
· A remuneração da agência não estiver claramente destacada;
· A operação não estiver estruturada como intermediação formal.
Portanto, é crucial ajustar a forma de emissão da nota fiscal e de recebimento de valores, para que o sistema não recolha tributo sobre receita que não pertence à agência.
8. Como o novo regime afeta o caixa, o capital de giro e o recebimento da comissão?
O novo regime de IBS e CBS, especialmente com a implantação do split payment (pagamento fracionado), pode impactar diretamente o caixa das agências de viagens, especialmente na forma como recebem sua comissão ou taxa de serviço.
Retenção automática dos tributos (split payment): A partir da implantação do sistema de pagamentos centralizados (prevista a partir de 2026 e obrigatória em 2029), o valor do IBS e da CBS será retido diretamente no momento do pagamento pela instituição financeira ou intermediador de pagamento. Isso reduz o valor líquido repassado à agência, afetando sua disponibilidade imediata de caixa.
Comissão precisa estar destacada: Se a comissão não estiver claramente destacada na nota fiscal, o sistema poderá entender que todo o valor recebido pertence à agência e reter o imposto sobre a totalidade da operação, o que compromete severamente o capital de giro.
Operações de repasse de valores a terceiros: Quando a agência atua como intermediária e fatura o valor total, mas precisa repassar grande parte aos fornecedores (ex: hotéis, companhias aéreas), a retenção do IBS/CBS pelo split paymentpode gerar inviabilidade financeira da operação, caso a estrutura documental não permita excluir esses valores da base de cálculo.
Há riscos práticos para o fluxo de caixa como a redução do recebimento líquido da comissão, o aumento da necessidade de capital de giro para cobrir a diferença entre recebimentos e repasses e a retenção indevida de tributo, caso o sistema entenda a agência como prestadora principal.
O novo regime exige que a agência de viagens estruture adequadamente sua documentação fiscal e contratual, destaque corretamente sua comissão na nota fiscal, evite faturar o valor total sem segregação — sob pena de retenções indevidas pelo split payment — e reavalie sua política de recebimento, prazos e fluxo de caixa.
9. O modelo de negócio pode levar o fisco a entender que a agência é a prestadora do serviço principal?
Sim — o modelo de negócio pode levar o fisco a entender que a agência é a prestadora do serviço principal, mesmo quando ela atua apenas como intermediária, caso não haja documentação clara demonstrando essa condição.
Situações que favorecem essa interpretação pelo fisco:
· Nota fiscal emitida com o valor total, sem destaque da comissão ou dos valores de terceiros;
· Contrato com o cliente em nome da agência, sem cláusula de intermediação ou “por conta e ordem”;
· Ausência de identificação do fornecedor real (hotel, cia. aérea etc.);
· Ausência de repasse direto ao fornecedor (a agência faz o pagamento com seus próprios recursos);
· Atuação comercial com aparência de venda direta (site, atendimento e emissão em nome da agência, sem ressalvas).
Consequências se o fisco entender que a agência é a prestadora:
· IBS e CBS incidem sobre o valor total da operação, e não apenas sobre a comissão;
· Pode haver bitributação, se o fornecedor também tiver recolhido IBS/CBS;
· A agência responde por obrigações acessórias, como obrigação de prestar serviço, responsabilidade civil, etc.;
· Risco de autuações fiscais e exigência de tributo retroativo, com multa e juros.
Como evitar esse risco:
· Emitir NF-e ou NFS-e com destaque claro da comissão e segregação dos valores de terceiros;
· Usar contratos com cláusulas de intermediação por conta e ordem;
· Identificar na nota e nos sistemas quem é o fornecedor real e o cliente final;
· Ter consistência entre documentos fiscais, contratos e práticas operacionais.
10. A agência pode ser considerada fornecedora do serviço total, portanto, responsável tributária por toda a operação, ou prestadora de serviço de intermediação?
Sim — dependendo da forma como a operação é estruturada e documentada, a agência pode ser considerada:
1. Intermediadora (sem responsabilidade tributária plena). Isto ocorre quando:
- Atua em nome do cliente (por conta e ordem);
- Não assume o risco nem entrega direta do serviço;
- Emite nota destacando comissão e valores de terceiros.
Neste caso, o IBS/CBS incidem somente sobre a comissão, a agência não é considerada prestadora do serviço principal, mas sim mera intermediária, nos termos do art. 289 e do art. 12, §2º, IV da LC 214/2025 (§ 2º Não integram a base de cálculo do IBS e da CBS: IV - os reembolsos ou ressarcimentos recebidos por valores pagos relativos a operações por conta e ordem ou em nome de terceiros, desde que a documentação fiscal relativa a essas operações seja emitida em nome do terceiro;).
2. Prestadora de serviço (com responsabilidade tributária plena), quando:
- Emite nota com valor total do serviço sem separar comissão;
- Assina contrato com o cliente sem menção à intermediação;
- Recebe integralmente o valor e repassa ao fornecedor depois;
- Age como se vendesse diretamente o serviço turístico.
Resultado: o IBS e CBS incidem sobre o valor total da nota e a a agência é tratada como prestadora do serviço final, com todos os encargos e responsabilidades, incidindo em bitributação (agência e fornecedor).
A segurança jurídica da agência depende de clareza na documentação: se não houver distinção entre intermediação e prestação direta, o fisco pode atribuir à agência o papel de prestadora, com tributação ampliada e riscos fiscais.
Bitributação e segregação fiscal
11. Há risco de bitributação entre a agência e o fornecedor (ex: hotel, companhia aérea)?
Sim, há risco real de bitributação entre a agência de viagens e o fornecedor (como hotéis e companhias aéreas), especialmente se a operação não for bem estruturada fiscalmente no novo regime do IBS e da CBS.
Como ocorre a bitributação:
- Fornecedor (ex: hotel) emite nota fiscal diretamente ao cliente, com IBS/CBS destacados; e,
- A agência também emite nota fiscal ao cliente, com o valor total da operação (incluindo o valor do hotel) sem destacar sua comissão.
Resultado: o mesmo serviço é tributado duas vezes, a primeira pelo fornecedor real, que prestou o serviço e, na sequência, pela agência, que será considerada como se tivesse prestado o serviço completo.
Esse risco aumenta quando:
- A agência não destaca a comissão na nota fiscal;
- Não há identificação do prestador real do serviço;
- O contrato com o cliente omite a condição de intermediação;
- O faturamento ocorre em nome próprio, mas sem a segregação de valores de terceiros.
Como evitar a bitributação:
Medida preventiva | Efeito prático |
Destacar apenas a comissão na nota fiscal | IBS/CBS incidem só sobre a comissão |
Utilizar o modelo por conta e ordem | Receita do serviço é do fornecedor |
Identificar o fornecedor real e o comitente (cliente representado) na NF | Garante caracterização de intermediação |
Evitar emitir nota pelo valor total da operação sem segregação | Reduz risco de autuação |
Fundamento legal:
- LC 214/2025, art. 12, §2º: permite excluir da base de cálculo os valores recebidos por conta de terceiros, desde que caracterizada a intermediação;
- Nota Técnica 2025.002: prevê campos específicos nos novos leiautes da NF-e e NFS-e para destacar valores de terceiros, comissões e prestadores reais.
A bitributação pode ser evitada, mas depende de documentação clara, nota fiscal corretamente emitida e contratos bem redigidos. A ausência de clareza faz o fisco presumir que a agência é a prestadora do serviço integral, o que amplia indevidamente a base tributável.
12. É possível destacar os valores de terceiros na nota fiscal? Isso afeta a tributação?
Sim, é possível — e altamente recomendável — destacar os valores de terceiros na nota fiscal. E isso afeta diretamente a tributação, reduzindo a base de cálculo do IBS e da CBS.
Fundamento legal e técnico:
- LC 214/2025, art. 12, §2º: “A base de cálculo do IBS e da CBS exclui os valores recebidos por conta de terceiros, desde que o sujeito passivo não seja o prestador do serviço nem o alienante do bem.”
- Nota Técnica 2025.002 (RTC – NF-e/NFS-e): Prevê campos específicos para:
Receita própria (comissão);
Valores de repasse a terceiros;
Identificação do comitente e do prestador real;
Indicação do tipo de intermediação (por conta e ordem, por encomenda etc.).
Efeitos fiscais do destaque correto:
Situação | Base de cálculo do IBS/CBS |
Valor de terceiros não destacado | Total da nota (inclusive valor de terceiros) |
Valor de terceiros destacado corretamente | Apenas a comissão ou fee da agência |
Exemplo prático: Faturamento total: R$ 10.000, sendo R$ 9.000 para o hotel e R$ 1.000 de comissão da agência:
Situação | IBS/CBS incidem sobre |
Nota sem destaque | R$ 10.000 |
Nota com destaque de terceiros | R$ 1.000 (comissão) |
Condições obrigatórias para isso funcionar:
- A agência deve atuar como intermediária (não como prestadora do serviço);
- A nota fiscal deve conter campos específicos para destacar os valores;
- Deve haver coerência contratual e operacional (modelo “por conta e ordem”, preferencialmente);
- O sistema emissor da agência deve estar atualizado com os novos leiautes NF-e/NFS-e com cClassTrib e campos de intermediação.
13. A legislação e os leiautes da Nota Fiscal Nacional (NFS-e) permitem segregar claramente o valor do serviço do fornecedor? Esse destaque exclui tais valores da base do IBS/CBS?
Sim, a legislação e os leiautes da Nota Fiscal Nacional (NFS-e) permitem — e incentivam — a segregação clara entre o valor do serviço prestado por terceiros (fornecedores), e a remuneração da agência (comissão ou taxa de serviço).
Esse destaque exclui tais valores da base de cálculo do IBS e da CBS, desde que a agência atue como intermediária e não como prestadora principal.
Fundamento legal:
- LC 214/2025, art. 12, §2º: Permite excluir da base de cálculo os valores recebidos por conta de terceiros, desde que o contribuinte não seja o prestador do serviço.
- A Nota Técnica 2025.002 estabelece campos específicos nos leiautes da NFS-e para:
- Indicar intermediação de serviço;
- Identificar o prestador real e o tomador (cliente);
- Segregar valores recebidos por conta de terceiros; e,
- Apresentar a remuneração própria da agência (comissão, taxa de serviço).
Os campos da nota fiscal agora permitem informar:
Campo Finalidade
cClassTrib Código de classificação tributária da operação
tpIntermed Tipo de intermediação (por conta e ordem, etc.)
vReceitaIntermed Valor da comissão ou taxa de serviço da agência
vRepasseTerceiros Valor a ser repassado ao fornecedor real do serviço
IdTomador/IdPrestadorReal Identificação do cliente e do prestador do serviço
Condições para que o destaque exclua da base:
- A operação deve ser uma intermediação formal;
- A nota fiscal deve refletir fielmente os papéis de cada parte;
- A agência não pode ser considerada prestadora direta do serviço;
- O valor de terceiros precisa estar segregado e identificado no campo correto.
Crédito para clientes e impacto competitivo
14. Os clientes da agência terão direito ao crédito integral dos tributos destacados?
Os clientes das agências optantes pelos regimes Lucro Presumido e Lucro Real terão direito ao crédito integral do IBS e da CBS destacados, desde que os seguintes requisitos sejam atendidos:
Requisitos para o crédito integral pelo cliente (adquirente):
· O serviço seja efetivamente utilizado na atividade da empresa (ex: viagem corporativa);
· A nota fiscal esteja corretamente emitida, com:
· Identificação do cliente como tomador do serviço;
· IBS e CBS destacados separadamente;
· Código de Classificação Tributária (cClassTrib) correto;
· A nota reflita apenas a comissão da agência, ou, se refletir o valor total, este esteja completamente tributado, sem repasse sem destaque.
Cuidados específicos:
· Se a agência tributar apenas a comissão, o crédito do cliente será somente sobre o valor da comissão;
· Se tributar o valor total, o cliente poderá se creditar desse montante, mas isso pode gerar bitributação com o fornecedor (ex: hotel, cia aérea), se também houver IBS/CBS na nota do fornecedor;
· Se a agência estiver no Simples Nacional, o crédito será limitado ou inexistente, salvo se ela optar por tributar o IBS/CBS fora do DAS, conforme previsto na LC 214/2025.
Os clientes podem se creditar integralmente, mas o valor do crédito dependerá de como a agência tributa sua operação. Transparência e consistência documental são essenciais para garantir esse direito e evitar passivos fiscais ou glosas em fiscalizações.
Além disso, agências que adotam práticas robustas de gestão documental e contam com sistemas eficazes de controle de notas fiscais de seus fornecedores ganham uma vantagem competitiva importante no novo cenário tributário.
A capacidade de emitir documentos fiscais com precisão, reunir documentos fiscais emitidos pelos fornecedores, manter registros organizados e comprovar a regularidade das operações facilita o repasse dos créditos aos clientes, reduz o risco de glosas em fiscalizações e transmite maior confiança às empresas contratantes — especialmente em relações B2B. Essa postura profissional tende a diferenciar positivamente a agência no mercado, contribuindo para sua retenção e conquista de clientes mais exigentes sob o ponto de vista fiscal.
15. Qual é o impacto da Reforma Tributária no modelo de faturamento?
Muitas adotam o modelo de faturamento dos serviços, ou seja, pagam os fornecedores com recursos próprios, recebem estes valores sob a forma de reembolso posteriormente, em alguns casos agregando uma taxa de serviço bem destacada e em outros casos aplicando um markup, sem destacar claramente o custo dos serviços dos fornecedores finais.
Este modelo de operação requer muita atenção a partir da implementação da Reforma Tributária. Em primeiro lugar devemos nos atentar para o impacto do modelo de faturamento sobre o montante de tributo a ser pago pela agência e sobre o correspondente crédito dos clientes. Vejamos os seguintes exemplos:
Cenário 1 – Faturamento do valor total da operação (sem segregação):
- A agência emite nota com R$ 10.000, sendo R$ 9.000 de custo com terceiros e R$ 1.000 de comissão.
- IBS/CBS incidem sobre R$ 10.000.
- O cliente pode se creditar do valor cheio (26,5% de R$ 10.000).
A vantagem para o cliente é poder se apropriar do crédito integral.
Para a agência há risco bitributação e ônus fiscal indevido, pois será tributada sobre valores que não são receita própria.
Cenário 2 – Faturamento apenas da comissão (com destaque de valores de terceiros):
- A agência emite nota com R$ 1.000 (sua remuneração), e o fornecedor (hotel/cia aérea) fatura os R$ 9.000 ao cliente (a nota fiscal deve ser emitida ao cliente e não à agência).
- IBS/CBS incidem apenas sobre a comissão.
Para que o cliente aufira o crédito integral da operação, tanto a agência em relação aos R$ 1.000,00 da sua remuneração, quanto o fornecedor, devem emitir nota fiscal com IBS/CBS, destacando o cliente como tomador dos serviços. Há obviamente uma maior complexidade na organização documental desta operação.
O risco de pressão comercial surgirá quando o fornecedor não emitir nota diretamente ao cliente ou não estiver enquadrado como gerador de créditos de IBS e CBS. Nestes casos, o cliente só receberá a nota da agência com o crédito destacado.
Conclusão prática:
Modelo de faturamento | Crédito do cliente | Risco para a agência |
Valor total (sem segregação) | Integral (porém com risco de bitributação) | Alto (tributação indevida) |
Comissão destacada + nota do fornecedor | Integral (com crédito dividido entre notas) | Baixo (seguro e conforme LC 214) |
Outro aspecto relevante é que sob o novo sistema, o direito ao crédito de IBS e CBS somente será reconhecido na proporção da efetiva liquidação financeira da operação. Ou seja, o simples recebimento da nota fiscal com o destaque dos tributos não será suficiente: será necessário que a empresa tenha efetivamente pago pela aquisição. Esse modelo reforça a integração entre a escrituração fiscal e o controle financeiro, exigindo das empresas maior rigor na conciliação de suas entradas e saídas para assegurar o aproveitamento correto dos créditos tributários.
Por exemplo, a sua agência irá atender um grupo de pessoas para uma viagem na próxima semana (aéreo + hotel) ao custo de R$ 10.000,00. Os fornecedores emitem as notas fiscais para o CNPJ do seu cliente e a sua agência faz a quitação antecipada.
Por outro lado, a sua agência fez a venda sob o formato faturado ao cliente, com vencimento em 60 dias, ou seja, a liquidação financeira da sua nota fiscal ocorrerá após este prazo.
O cliente receberá logo no começo da operação o crédito decorrente das notas fiscais emitidias pelos fornecedores, obviamente se estes forem geradores de crédito. Ele só terá o crédito da nota fiscal da agência após a sua quitação (60 dias).
Se, por qualquer razão o cliente verificar que não se creditou completamente dos valores de IBS e CBS oriundos das notas fiscais dos fornecedores, as agências precisam se precaver contratualmente para que ele não faça a glosa do valor não creditado diretamente na sua remuneração.
Por isso, a venda faturada, que já é motivo de procupação entre as agências de viagens, sobretudo as do mercado corporativo, ganhou um novo ingrediente com a Reforma Tributária, dado que o sistema de créditos de IBS e CBS deverá ser muito bem explorado por aqueles que possuem bom planejamento tributário.
16. Qual o melhor regime tributário para a agência diante da reforma? Se a agência estiver no Simples, vale a pena migrar para o regime normal para possibilitar créditos ao cliente?
A escolha entre o Simples Nacional, o regime normal de apuração (Lucro Presumido ou Lucro Real) ou o novo regime híbrido previsto na LC nº 214/2025 dependerá de uma combinação de fatores:
· Estratégia comercial da agência;
· Perfil dos clientes (B2B ou consumidor final);
· Margem operacional e estrutura de custos;
· Capacidade de organização fiscal e documental.
a) Agência no Simples Nacional
Vantagens: | Carga tributária unificada via DAS; |
Obrigações acessórias mais simples; | |
Alíquota efetiva reduzida para agências de menor porte. | |
Desvantagens:
| O IBS e a CBS recolhidos dentro do DAS não geram crédito ao cliente; |
Pode comprometer a competitividade em contratos corporativos (B2B); | |
Limitação de acesso a grandes contas e licitações, que exigem destaque tributário. |
A partir de 2027, o adquirente no regime normal (Lucro Presumido ou Lucro Real) poderá se creditar da fração de IBS e CBS efetivamente paga pelo fornecedor optante pelo Simples Nacional que adotar o modelo híbrido, desde que essa parcela esteja corretamente destacada no documento fiscal. No entanto, esse crédito será apenas parcial, limitado à proporção dos tributos efetivamente recolhidos fora do regime unificado, e sua apropriação exigirá precisão técnica e contábil no preenchimento da nota fiscal — o que nem sempre ocorre, especialmente entre empresas de menor porte, com estruturas fiscais menos robustas.
b) Regime Híbrido – uma alternativa para agências no Simples
A Lei Complementar nº 214/2025 prevê uma alternativa intermediária chamada regime híbrido, que permite que uma empresa optante do Simples apure separadamente o IBS e a CBS, fora do DAS, para gerar crédito integral ao cliente.
Como funciona:
· A empresa continua no Simples, mas passa a emitir nota fiscal com destaque separado de IBS/CBS;
· Assume as obrigações acessórias do regime regular para IBS/CBS (escrituração, apuração, plataforma nacional);
· Permite que o cliente B2B aproveite 100% dos créditos sobre o valor destacado.
Vantagens: | Ganho de competitividade frente a concorrentes que não geram crédito; |
Ideal para quem vende majoritariamente para empresas do regime normal; | |
Mantém alguns benefícios do Simples, como menor IRPJ/CSLL em faixas de faturamento menores. | |
Desafios: | A agência passa a cumprir duas realidades fiscais simultâneas (Simples para parte dos tributos e regime regular para IBS/CBS); |
Aumenta a complexidade operacional e o custo de conformidade; | |
Pode não compensar para agências com pequeno volume de vendas para clientes que aproveitam créditos. |
A adoção do regime híbrido implicará um aumento significativo na complexidade operacional dessas empresas, que passarão a apurar tributos em duas sistemáticas distintas: o Simples para tributos sobre a renda e o regime regular para os tributos sobre o consumo. Esse novo cenário exigirá das micro e pequenas empresas um esforço de adaptação tecnológica, contábil e estratégica para garantir conformidade fiscal e preservar a competitividade no mercado B2B.
c) Agência no Regime Normal (Lucro Presumido ou Real)
Para avaliar a migração para o regime normal de apuração, a agência de viagens deve considerar cuidadosamente o perfil de sua operação, a natureza de seus clientes e sua capacidade de organização fiscal. Entre as principais vantagens do regime normal, destaca-se a possibilidade de geração de crédito integral de IBS e CBS para os clientes, desde que os tributos estejam corretamente destacados na nota fiscal. Essa característica se torna especialmente relevante em operações B2B, nas quais o crédito tributário impacta diretamente o custo da cadeia e pode se tornar um fator decisivo na escolha de fornecedores. Além disso, no modelo de intermediação com emissão própria de nota fiscal, a tributação incide apenas sobre a comissão recebida pela agência — sua receita própria — e não sobre o valor total da operação, aplicando-se, após a redução de 40% na base de cálculo, uma alíquota efetiva de 15,90% para IBS e CBS, o que pode ser mais vantajoso do que a carga concentrada no Simples Nacional.
Outro ponto a favor é o alinhamento integral ao novo sistema tributário, facilitando o relacionamento com clientes de maior porte e demonstrando maior transparência e sofisticação fiscal, o que tende a ser valorizado no ambiente corporativo.
Por outro lado, a adoção do regime normal também impõe desafios: aumenta a complexidade contábil, eleva o custo de conformidade e exige um controle fiscal mais apurado, com escrituração detalhada e acompanhamento rigoroso das obrigações acessórias.
Vantagens: | Geração de crédito integral de IBS/CBS para o cliente, quando destacados corretamente; |
Tributação apenas sobre a comissão (receita própria), com alíquota reduzida de 15,90% (após redução de 40%); | |
Alinhamento total ao novo sistema tributário e exigências de clientes B2B. | |
Desvantagens: | Maior complexidade contábil; |
Custo de conformidade mais elevado; | |
Necessidade de organização fiscal detalhada. |
d) Comparativo (Agências de Viagens): Simples Nacional × Regime Normal × Regime Híbrido
A decisão deve ser precedida de uma análise comparativa entre regimes, considerando não apenas a carga tributária, mas também a estrutura administrativa da empresa, o perfil da clientela e o volume de operações sujeitas ao repasse de crédito tributário.
Regime Tributário | Alíquota IBS/CBS | Geração de crédito para o cliente | Vantagem competitiva B2B | Exigência documental |
Simples Nacional | Inclusa no DAS, depende da faixa de faturamento | Não gera até 2027; depois, crédito parcial se destacado corretamente | Baixa | Moderada |
Regime Híbrido (Simples + apuração separada) | 15,90% sobre a comissão (base reduzida)* | Gera crédito integral sobre o valor destacado | Alta, se bem estruturado | Alta |
Regime Normal |
15,90% sobre a comissão (base reduzida)* | Gera crédito integral sobre o valor destacado | Alta | Muito alta |
· Redução para a hipótese de intermediação de serviços turísticos - CBS: 9,3% x 60% = 5,58%, IBS: 17,2% x 60% = 10,32%, Total: 15,90% (após redução de 40%).
A reforma favorece agências que atuam no regime normal, com comissão destacada e operações estruturadas como intermediação, pois permite tributação apenas sobre a receita própria, a aplicação de alíquota reduzida de 15,90% (40% de redução sobre os 26,5%) e a geração de crédito integral de IBS/CBS para os clientes — essencial em contratos B2B.
A opção pelo Simples Nacional, embora mantenha simplicidade e alíquota efetiva menor em alguns casos, pode comprometer a atratividade comercial frente a clientes que não conseguem se creditar dos valores pagos e limitar o acesso a contratos corporativos, especialmente em licitações ou grandes contas.
Ressaltamos: A redução de 40% da base de cálculo do IBS/CBS no regime normal se aplica exclusivamente às agências que atuam como intermediárias, auferindo receita sob a forma de comissão. Agências que operam no modelo de venda direta, ainda que optem pelo regime normal, deverão recolher os tributos sobre o valor total da operação, sem a redução prevista, o que pode resultar em uma alíquota efetiva significativamente mais elevada, próxima de 26,5%. Nesses casos, o Simples Nacional pode manter sua atratividade relativa, especialmente para empresas com margens reduzidas e estrutura operacional simplificada.
O ideal é realizar simulações comparativas, considerando:
- Perfil dos clientes (B2B ou consumidor final);
- Tipo de operação realizada pela agência (venda direta ou intermediação);
- Estrutura de custos e margem da agência;
- Possibilidade de reorganizar o faturamento (ex: destaque da comissão, repasse direto do fornecedor).
Regimes específicos e planejamento
17. A agência de viagens poderá ser beneficiada por regimes diferenciados de tributação?
Sim. A Reforma Tributária criou um regime fiscal específico e automaticamente aplicável às agências de viagens, que substitui os modelos antigos de ISS fixo e PIS/COFINS cumulativo. Esse novo regime está previsto nos arts. 288 a 291 da Lei Complementar nº 214/2025, e confere tratamento favorecido tanto na base de cálculo quanto na alíquota aplicável.
Regime específico das agências de turismo:
· Base de cálculo: limitada à remuneração da agência (comissão, taxa de serviço ou fee); os valores repassados aos fornecedores (como hotéis, companhias aéreas e locadoras) são excluídos da base tributável, desde que devidamente segregados e documentados.
· Alíquota reduzida: a agência, ao atuar como intermediária, aplica a mesma alíquota dos serviços de hotelaria, com redução de 40% sobre a alíquota cheia de 26,5%, resultando em alíquota efetiva de 15,90% sobre sua receita própria.
· Aplicação automática: esse regime não exige adesão formal ou habilitação específica — trata-se de um regime legalmente garantido e de aplicação direta, desde que cumpridos os requisitos de documentação e segregação fiscal.
Esse novo regime substitui os modelos hoje existentes, como: ISS fixo aplicado em muitos municípios; e PIS/COFINS cumulativo para prestadores de serviço sob o Lucro Presumido.
Ou seja, a reforma elimina a cumulatividade e cria um sistema mais racional, com incidência apenas sobre a receita própria da agência.
18. O regime de Margem de Valor Agregado (MVA) se aplica às agências de viagens?
Não. Embora o art. 281 da LC 214/2025 trate da aplicação de alíquotas reduzidas para alguns setores com base na margem de valor agregado, as agências de viagens não estão sujeitas a esse regime. Isso porque já possuem um tratamento mais específico e vantajoso nos arts. 288 a 291, o qual prevalece e torna desnecessária a aplicação do regime de MVA.
As agências de viagens contam com um regime próprio, automático e legalmente estruturado, com base de cálculo restrita à comissão e alíquota reduzida de 15,90%, desde que atuem como intermediárias de serviços turísticos com adequada segregação documental.
Trata-se de um benefício real e imediato, que substitui os modelos antigos e posiciona o setor com maior segurança jurídica e previsibilidade tributária no novo sistema.
19. O que a agência pode fazer com os créditos de IBS e CBS nas compras de serviços turísticos?
Quando a agência de viagens atua na modalidade de venda direta — ou seja, adquire os serviços de terceiros (como companhias aéreas, hotéis ou locadoras) e os revende aos seus clientes — ela se torna a contribuinte plena do IBS e da CBS, sendo responsável pelo recolhimento dos tributos sobre o valor total da operação. Nessa estrutura, a agência também passa a ter direito ao aproveitamento de créditos de IBS e CBS sobre os insumos adquiridos, conforme o princípio da não cumulatividade ampla, previsto nos arts. 47 a 56 da Lei Complementar nº 214/2025.
Essa possibilidade representa um dos pilares da lógica do novo sistema: o tributo é cobrado sobre o valor agregado, e não sobre o valor total, desde que haja controle documental adequado.
Ao adquirir serviços de terceiros com destaque de IBS/CBS na nota fiscal, a agência poderá se creditar do valor efetivamente pago nessas operações. Esse crédito poderá ser:
· Compensado com o IBS/CBS devido nas operações de venda;
· Acumulado para períodos futuros, caso haja saldo credor;
· Ressarcido em espécie, em casos previstos em lei (a regulamentar).
Exemplo prático: Suponha que uma agência venda ao cliente um pacote que inclui:
Ø R$ 1.500 em passagens aéreas (compradas de uma companhia aérea);
Ø R$ 1.000 em hospedagem (contratada com um hotel parceiro);
Ø R$ 500 de comissão da própria agência.
A depender da modalidade de operação, os impactos tributários e os créditos gerados serão muito diferentes, como mostra o quadro abaixo:
Modalidade de operação | Valor Aéreo | Valor Terrestre | Remuneração da agência | Base de cálculo do IBS/CBS | Alíquota IBS/CBS | Valor IBS/CBS | Crédito ao cliente | Crédito à agência * | Tributo a pagar |
Intermediação | 1.500 | 1.000 | 500 | 500 | 15,90% | 79,50 | 79,50 | 0,00 | 79,50 |
Venda direta * | 1.500 | 1.000 | 500 | 3.000 | 26,50% | 795,00 | 795,00 | 662,50 | 132,50 |
*Crédito estimado à agência: se os insumos (R$ 2.500,00) vierem com alíquota média de 26,5%, a agência pode ter direito a crédito aproximado de R$ 662,50 (2.500 × 26,5%). Se a agência adquirir estes insumos de fornecedores que não gerem crédito, o tributo a pagar será de R$ 795,00 na hipótese acima. |
Conclusões práticas:
· Na venda direta, a agência paga IBS/CBS sobre o valor total da operação, mas tem direito a crédito proporcional sobre os serviços adquiridos, o que reduz o imposto efetivamente devido.
· Na intermediação, a agência tributa apenas sua comissão, não tem direito a crédito sobre os insumos, e o benefício fiscal se concentra no cliente, que pode se creditar do IBS/CBS destacado.
· A opção pela venda direta só será vantajosa se o valor agregado pela agência for elevado, e se houver margem operacional suficiente para suportar a complexidade do modelo.
· O correto controle dos documentos fiscais de entrada, com destaque dos tributos, será essencial para que o crédito seja aceito. A ausência de escrituração ou a contratação informal de fornecedores poderá inviabilizar o benefício.
O que a agência deve fazer?
· Confirmar com seus fornecedores se os serviços contratados serão tributados pelo novo sistema (IBS/CBS) e se haverá emissão de nota fiscal com destaque;
· Validar os campos obrigatórios da NFS-e, como o código de classificação tributária (cClassTrib), para garantir a efetividade do crédito;
· Incluir cláusulas nos contratos com fornecedores exigindo regularidade fiscal e emissão de documentos compatíveis com o novo sistema;
· Ajustar seus sistemas de gestão e contabilidade para controlar os créditos de IBS e CBS de forma segregada e mensal;
· Avaliar se a estrutura de venda direta compensa, em comparação com o modelo de intermediação, considerando o impacto sobre margem, carga tributária e competitividade comercial.
Contratos e ajustes operacionais para garantir os benefícios fiscais
20. Como a reforma afeta contratos em andamento e operações futuras?
O Capítulo IV (arts. 373 a 377) da LC 214/2025 trata exclusivamente do reequilíbrio de contratos celebrados com a Administração Pública.
Os contratos entre particulares não têm previsão de reequilíbrio automático ou obrigatório pela LC 214/2025. Também não há tratamento especial para contratos privados com faturamento futuro ou prestação continuada.
Os contratos no âmbito privado continuam regidos pelas regras do Código Civil e segundo a legislação civil (art. 317 e art. 478 do Código Civil), a parte prejudicada por alteração superveniente relevante (como mudança abrupta da carga tributária) pode buscar judicialmente ou contratualmente a revisão do contrato, desde que comprove onerosidade excessiva, desequilíbrio imprevisível e relevante ou que a carga tributária não era esperada ou contemplada na matriz de risco do contrato.
Mas isso não é automático — depende de prova, negociação ou decisão judicial/arbitral.
Mesmo sem regramento legal específico, recomenda-se às agências que incluam cláusula de recomposição contratual em novos contratos, como: "As partes poderão renegociar os valores contratados em caso de alteração legislativa relevante que impacte de forma significativa a carga tributária incidente sobre a operação."
É recomendado também revisar contratos em andamento, especialmente os de longo prazo ou faturamento futuro, para atualizar cláusulas de reajuste e tributos e evitar interpretação restritiva contra a possibilidade de reequilíbrio.
21. Como os contratos em vigor devem ser ajustados para garantir a correta segregação de valores, o destaque da comissão na nota fiscal e a aplicação automática do regime específico previsto na LC nº 214/2025?
Embora a Lei Complementar nº 214/2025 preveja, de forma expressa, o reequilíbrio dos contratos administrativos, os contratos entre particulares não possuem previsão específica e, portanto, continuam regidos pela legislação civil e contratual vigente. Nesse contexto, é altamente recomendável revisar os contratos em andamento, especialmente os de longo prazo ou com faturamento futuro, para:
· Atualizar cláusulas sobre tributos e reajuste, refletindo a substituição do PIS, COFINS, ISS e ICMS por CBS e IBS;
· Evitar interpretações restritivas quanto à possibilidade de recompor a equação econômico-financeira do contrato, caso a nova sistemática altere a carga tributária efetiva;
· Incluir cláusulas que permitam o destaque da comissão da agência, garantindo conformidade com o regime específico do art. 289 da LC nº 214/2025;
· Prever a possibilidade de retenção automática de tributos via split payment, para alinhar o contrato às novas práticas operacionais e fiscais;
· Assegurar que os valores de terceiros sejam claramente segregados e documentados, evitando a tributação indevida sobre verbas que não compõem a receita da agência.
Além disso, em novos contratos, recomenda-se incluir cláusulas que identifiquem com clareza a natureza da atividade da agência como intermediária, estabeleçam a forma de segregação de valores na nota fiscal e adotem uma política clara sobre o reembolso ou não da comissão da agência em caso de cancelamento.
Esses cuidados são essenciais para preservar margens, garantir segurança jurídica e manter a atratividade comercial no novo ambiente tributário. Se não forem revisados, os contratos podem gerar disputas sobre valores, impedir o aproveitamento de créditos tributários pelos clientes e atribuir à agência responsabilidades fiscais que não lhe cabem.
22. Como a agência deve formalizar sua relação com fornecedores para reforçar o enquadramento como intermediária e garantir os benefícios do novo regime?
O correto enquadramento da agência como intermediadora é fundamental para garantir a aplicação do regime favorecido da LC nº 214/2025 (art. 289), que prevê:
Base de cálculo restrita à comissão;
Alíquota reduzida (15,90%);
Possibilidade de geração de crédito integral para os clientes no regime normal.
Para evitar que a Receita Federal ou os fiscos locais interpretem a operação como venda direta — sujeita à tributação sobre o valor total —, é essencial estruturar adequadamente a documentação contratual e operacional com os fornecedores.
As recomendações são:
Contratos de intermediação com fornecedores (hotéis, locadoras, cias. aéreas), prevendo expressamente que a agência atua como mandatária ou comissionada, sem assumir o serviço como seu;
Remuneração por comissão (por exemplo, taxa DU) ou fee, com destaque claro em contrato e nota fiscal;
Evitar o recebimento de notas fiscais de terceiros em nome da agência, que possam indicar fornecimento direto;
Separação contábil e bancária entre valores próprios e valores de terceiros, especialmente em grandes eventos ou viagens corporativas;
Cláusulas de limitação de responsabilidade nos contratos com clientes, reforçando o papel de intermediadora;
Segregação fiscal e documental nas notas fiscais emitidas, com destaque de valores intermediados e da remuneração da agência.
Essas práticas reduzem riscos de autuações e são cruciais para usufruir com segurança dos benefícios fiscais do novo sistema tributário.
23. Quais cuidados devem ser adotados pelas agências que contratam diretamente fornecedores em nome próprio, fora do modelo de intermediação?
Embora a reforma tributária tenha mantido um regime específico para agências de turismo que operam como intermediárias, é comum que algumas agências contratem diretamente hotéis, companhias aéreas, locadoras e outros fornecedores para compor pacotes turísticos ou eventos, revendendo esses serviços a seus clientes. Essa prática é legítima, mas acarreta impactos relevantes sob o novo sistema tributário.
Nesses casos, a agência assume a posição de fornecedora final do serviço perante o cliente, e o valor total da operação (comissão + custo dos serviços agregados) compõe a base de cálculo do IBS e da CBS, sem aplicação do regime especial previsto no art. 289 da LC nº 214/2025. A alíquota integral do sistema (estimada em 26,5%) será aplicada sobre o preço total.
Portanto, agências que atuam no modelo de venda direta devem avaliar cuidadosamente a viabilidade econômica dessa estrutura diante da nova carga tributária, considerando que a tributação incidirá sobre o valor total da operação.
Também é recomendável examinar a possibilidade de reorganizar a operação para se aproximar do modelo de intermediação, que goza de tratamento fiscal mais vantajoso. Além disso, é fundamental garantir o correto enquadramento contábil e fiscal da atividade, a fim de evitar autuações e questionamentos sobre a natureza da receita.
Por fim, os contratos firmados com os clientes devem explicitar, de forma clara, a responsabilidade da agência pelos serviços prestados e os termos da venda direta, assegurando alinhamento entre a estrutura operacional e a realidade contratual.
24. Quais são os pontos centrais de um checklist para adequação à Reforma Tributária?
Para se adaptar de forma segura e estratégica às novas regras do sistema tributário, as agências de viagens devem adotar medidas preventivas, revisar processos e alinhar seus contratos e sistemas com as exigências da Lei Complementar nº 214/2025. Abaixo, reunimos um checklist prático para guiar essa transição:
o A agência emite nota fiscal com destaque da comissão ou taxa de serviço, conforme exigido para aplicação do regime específico?
o Os valores de terceiros são segregados corretamente nas notas fiscais e nos documentos internos?
o Os contratos com fornecedores e clientes identificam claramente a agência como intermediária, e não como prestadora direta do serviço?
o Os contratos em vigor foram revisados para prever reequilíbrio econômico-financeiro em função de mudanças tributárias, nos termos do art. 317 do Código Civil?
o Os sistemas da agência estão preparados para split payment, nova base de cálculo, destaque 'por fora' e classificação tributária (cClassTrib)?
o A agência avaliou se deve permanecer no Simples Nacional, migrar para o regime normal ou adotar o regime híbrido, especialmente em contratos B2B?
o Já foram realizados testes comparativos de carga tributária e repasse de créditos para os clientes corporativos?
o A equipe fiscal, contábil e comercial da agência está treinada para aplicar corretamente as novas regras a partir de 2026?
o Vale a pena continuar no Simples Nacional, adotar um sistema híbrido ou migrar para o Lucro Presumido ou Real?
o A agência avalia regularmente se sua operação se caracteriza como intermediação ou venda direta e qual o impacto tributário de cada modelo?
o Nos casos de venda direta, os fornecedores emitem notas fiscais com destaque de IBS/CBS e os sistemas da agência registram adequadamente os créditos?
o A agência controla mensalmente os créditos de IBS/CBS de forma segregada e utiliza essas informações na apuração do tributo a pagar?
o Os contratos com fornecedores preveem a obrigação de emissão de documentos fiscais com destaque de tributos, para garantir o aproveitamento dos créditos?
o A margem de lucro da agência comporta os riscos e encargos adicionais da estrutura de venda direta, em comparação com o modelo de intermediação?
Esse checklist deve ser revisitado periodicamente ao longo do período de transição (2026 a 2032) e serve como ponto de partida para um plano de ação interno. Agências que se anteciparem e organizarem suas operações com base na nova sistemática estarão mais preparadas para garantir conformidade, segurança jurídica e vantagem competitiva.
25. Glossário Essencial da Reforma Tributária para Agências de Viagens
CBS – Contribuição sobre Bens e Serviços: Tributo federal que substituirá o PIS e a COFINS. Incide sobre operações com bens e serviços e será apurado de forma não cumulativa. Sua alíquota de referência será definida pelo Senado, mas estima-se algo em torno de 9,3%.
IBS – Imposto sobre Bens e Serviços: Tributo estadual/municipal que substituirá o ICMS e o ISS. Também incidirá sobre bens e serviços de forma não cumulativa e será gerido por um Comitê Gestor nacional. A alíquota estimada é de 17,2%.
Intermediação: Modalidade de operação em que a agência atua como representante do cliente, intermediando a contratação de serviços com terceiros (como hotéis ou companhias aéreas), recebendo apenas uma comissão pela operação. Nesse modelo, a base de cálculo do IBS/CBS é a comissão.
Venda Direta: Modalidade em que a agência compra os serviços turísticos de fornecedores e os revende ao cliente final como se fosse a prestadora. Nesse caso, o tributo incide sobre o valor total da venda. Em contrapartida, a agência pode se creditar do IBS/CBS pago nas aquisições.
Regime Normal de Apuração: Refere-se ao Lucro Presumido ou Lucro Real, regimes em que a empresa apura tributos federais separadamente, com base nas receitas e custos. Nesse regime, o IBS e a CBS são apurados com direito ao crédito integral.
Simples Nacional: Regime tributário simplificado para micro e pequenas empresas. A carga tributária é recolhida em guia única (DAS), sem direito a créditos de IBS/CBS pelos clientes — exceto se adotado o regime híbrido.
Regime Híbrido (para o Simples Nacional): Alternativa prevista na LC nº 214/2025 que permite à empresa do Simples optar por apurar e recolher o IBS/CBS separadamente, gerando créditos para os clientes. Exige escrituração completa e cumprimento das regras do regime normal.
Split Payment: Sistema de pagamento fracionado em que a instituição financeira, no momento da liquidação, separa automaticamente a parcela do valor correspondente aos tributos e os direciona ao Fisco, depositando apenas a parte líquida ao fornecedor.
Segregação de Valores de Terceiros: Prática contábil e fiscal de separar, na nota fiscal e na contabilidade, os valores que correspondem a serviços prestados por terceiros e os valores que compõem a remuneração da agência. Essencial para evitar bitributação e garantir a aplicação do regime específico.
cClassTrib (Código de Classificação Tributária): Novo campo obrigatório nas notas fiscais eletrônicas no modelo da Reforma Tributária. Indica a natureza da operação (venda direta, intermediação, etc.) e define o tratamento fiscal aplicável.
Crédito de IBS/CBS: Valor que pode ser abatido do imposto a pagar, correspondente ao IBS/CBS pago nas aquisições de bens e serviços necessários à atividade. Aplica-se apenas nos regimes não cumulativos.
Reequilíbrio Econômico-Financeiro:Princípio contratual que permite revisar cláusulas de contratos vigentes em caso de mudança significativa na carga tributária, como a trazida pela Reforma. Regulamentado pelo art. 317 do Código Civil.




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